Bem, como já não cozinho na primeira fervura, sou de uma época em que a maior fonte de informação eram os livros, e as redes de que fazia parte eram de grupos de pessoas que se encontravam "de verdade" para discutir o mundo e para fazer coisas, mais do que emitir opiniões sobre tudo o que por aí anda. Mas nem por isso sou um saudosista que nega as novas realidades. Sempre andei à procura das melhores formas de comunicar idéias, e quando mais novo, diversas foram as vezes que pensei em até ser jornalista.
Mas mesmo assim, as "novas tecnologias" me deixaram órfão várias vezes, profissionalmente falando.
Minha primeira profissão foi laboratorista fotográfico, preto e branco e colorido. Na época, profissão que era uma garantia para uma vida toda... Que nada, vieram os "mini-lab's", laboratórios automatizados, e adeus profissão!!!
Fui simultaneamente fotógrafo, evidentemente que com equipamentos analógicos. Então apareceram as câmeras digitais... e a popularização das mesmas reduziu o campo de trabalho imensamente.
Aprendi a editar video em "ilhas de edição"... apareceram os programas de edição.
Sempre trabalhando com arte, fiz muita arte final manual, pinturas, aquarelas, desenhos... E me defrontei que quando chegava a uma agência de publicidade, nem olhavam para o portfólio: perguntavam que programa usava...
Sinceramente, durante um bom tempo me senti irmanado com os ludistas, muito afim de destruir essas máquinas e tecnologias todas que estavam aí para nos tornar mais frágeis e dependentes...
Mas essa sensação passa, é verdade. No "milênio passado", quando também criávamos zines e jornais estudantis ou comunitários, panfletos e cartazes, de quanta utilidade teria sido a atual tecnologia!!!! Lembro que tinha uma máquina de escrever Olivetti, portátil, e era um "luxo" pois podia escrever em duas colunas...O que hoje faço apenas clicando num ícone, era toda uma função: escrever em colunas, recortar,colar... e depois fazer o fotolito corrigindo manualmente(a nanquim) o que estivesse errado. Ou criar artes para serigrafar camisetas e cartazes, colando papel na tela de serigrafia...
Fui aprender a admirar as tecnologias no ano de 1999, quando trabalhei junto com uma grande amiga, Aline, que era especialista em arte digital. Ficava encantado como ela conseguia cortar, colar, inverter cores, dimensionar tudo... o que teria levado muito tempo se feito manualmente, e que nunca teria ficado com a mesma qualidade.
E foi com outra colega, Mônica, que aprendi a lidar com o excel, que tive de usar muito quando fui
Conselheiro de Cultura e tinha que analizar o orçamento de dois ou três projetos por semana, para emitir pareceres.
Assim, aos poucos, fui me rendendo as "novas tecnologias". Primeiro, o computador era usado quase que como uma máquina de escrever e de diagramar, até que em 2003 passei a trabalhar em casa, e aderi a Internet. Mail e pesquisas enormemente melhoraram minha capacidade de circular pelo mundo. Passei a criar power points para cursos e palestras, e aos poucos fui me apropriando do Corel e do Paint. Sim, tenho que aprender o Photoshop e os programas de desenho digital. tenho que aprender a colorir digitalmente.Mas já tateio alguma coisa nessas searas.
Mas foi quando entrei na escola, em 2010, que me dei conta que tinha que usar melhor toda esta nova esfera da comunicação.
Primeiro criei este blog, destinado a dar suporte as pesquisas dos alunos. Trabalho em postar e preparar materiais...para descobrir que apenas 2% dos alunos acessava o mesmo. Reflexão e abandonei o mesmo. Passei a trabalhar com o Face, incentivando os alunos a criar grupos para discussão e pesquisa. Estão dando mais certo, e já somos vários os professores que estamos usando esta ferramenta.
Sempre lembrando que ela é uma ferramenta, e não o objetivo final, nem da educação, nem da vida. Blogs, orkuts, face, msn e quem sabe quantas esferas mais ainda haverão de se criar nesse mundo virtual.
Mas vim saber quão hiper dimensionado pode ser estes espaços quando aconteceu este ano um fato trágico. Uma aluna de 15 anos, menina que não demonstrava ter nenhum problema, se suicidou. Tomou uma dose enorme de remédios, e o corpo dela não resistiu. No dia que aconteceu fiquei muito abalado e postei junto com uma foto dela o seguinte texto:
"...Esta
menina se foi. Sim, assim, sem nos dar a chance de lhe ajudar, ou
talvez nos dizendo aos gritos de suas dores, esta menina de olhar doce se
suicidou. Sabia pouco dela, e me incomoda enormemente isso. Que diabos
de professor sou, que não vi nada? Como uma escola inteira não consegue
ver nada? que tipo de educação damos, preocupados em currículos, provas,
testes, notas, avaliações, que não temos tempo de saber deles mais do que isso?
...Percorri algumas turmas para dar a triste noticia, e lhes falei a
todos disso, mas também de quanto somos apaixonados por eles, de como
nos preocupam seus futuros, de como nos sentimos impotentes quando não
podemos fazer muita coisa, de como nos frustra saber que essa hora que
estaremos juntos as vezes não significará nada... ou pode mudar tudo.
...Careço de religiosidade. Nada me consola; além de que se ler qualquer preceito religioso sei que a maioria ainda a condenará por ter se quitado a vida. Eu, na minha cabeça e coração sem santos nem rezas, terei apenas um vazio enorme.
...Gurizada: sou professor por que amo a vida e odeio a morte. Não vejo nada de redentor na morte. E sei que estes tempos as vezes são tão ruins, que muitas vezes nos sentimos todos tão perdidos, tão em becos escuros onde não há heróis,apenas solidões e decepções. Então, para que não tenhamos mais essa dor, para que a cadeira vazia e a chamada sem resposta não se repita, se cuidem. E quando precisar, contem com a gente...
...Careço de religiosidade. Nada me consola; além de que se ler qualquer preceito religioso sei que a maioria ainda a condenará por ter se quitado a vida. Eu, na minha cabeça e coração sem santos nem rezas, terei apenas um vazio enorme.
...Gurizada: sou professor por que amo a vida e odeio a morte. Não vejo nada de redentor na morte. E sei que estes tempos as vezes são tão ruins, que muitas vezes nos sentimos todos tão perdidos, tão em becos escuros onde não há heróis,apenas solidões e decepções. Então, para que não tenhamos mais essa dor, para que a cadeira vazia e a chamada sem resposta não se repita, se cuidem. E quando precisar, contem com a gente...
...pois
é, meus amigos. Fica difícil ser um professor humanista, tendo 32
turmas, 1000 alunos,e tendo que fazer mágica para sobreviver com esse
salário indigno que recebemos. "Se" o modelo fosse outro,"se" pudéssemos
ter dedicação exclusiva; "se" as escolas não fossem pouco menos do que
depósitos, "se" a riqueza que nos leva a emprestar dinheiro a outros
países primeiro chegasse a nossa gurizada, não haveria estas tristezas.
Desculpem a franqueza, a sutileza hoje fugiu das minhas
possibilidades... Verdade, Alcides, há cursos, e aprendi bastante sobre
isso no Uruguay, esse pais que é ou era campeão em suicídios de jovens
na América Latina. A meus amigos na política, por favor: instem aos
governos a parar de discursar, e fazer o que tem que ser feito de
verdade... se não, essas tragedias se tornaram cotidianas...e depois,se tornarão fatos, números, dados a esquecer em relatórios frios. Como tudo..."(5 de julho de 2012)
O texto teve 481 compartilhamentos e 43 comentários. E me fez mais amigo de muitos e muitos de meus alunos, que passaram a me contar de suas vidas, tão complicadas e solitárias. E de muitas outras pessoas que apenas me conheceram pelo texto, até de outras cidades bem distantes da minha.
Então, é claro que hoje sou adepto as novas tecnologias. Mas tenho certeza de que se quem as usa não tem uma atitude diferente perante o mundo, as mesmas apenas se tornarão um "museu de velhas novidades".
Oi Ramon,
ResponderExcluira tua trajetória é tão rica que por vezes me perco na leitura das postagens. Concordo quando afirmas que os recursos (blog, facebook, etc.) são ferramentas "e não o objetivo final, nem da educação, nem da vida". Acho isso essencial para se poder atribuir a verdadeira dimensão das coisas.
Abraços,
Profa. Nádie